Quem sou eu?

in #br5 years ago

Quem sou eu?

Não sei ao certo, acho que nunca tive a chance de descobrir.

Até meus 14 anos eu era a garotinha rica criada pelos pais de criação que na verdade eram meus bisavôs, sempre era sacaneada pela minha irmã gêmea, era a garota gorda, baixinha e de óculos da escola, o motivo de chacota de todos.
Os poucos namoros que eu tive a maioria só se aproximou de mim e me seduziu achando que eu tinha alguma reserva financeira deixada pelos meus pais de criação, mas quando percebiam que eu era apenas mais uma garota ferrada eles pulavam fora do barco.
Passei por maus momentos aos quatorze anos, quando meu pai morreu foi um baque, eu precisava ser forte pela minha mãe e pela minha irmã. Eu estava arrasada, mas não podia deixar que notassem então quando ia até a casa que cresci cuidar das coisas pra minha mãe eu aproveitava e bebia um pouco da bebida que meu pai havia feito, tomava uma ou duas doses da pinga com mel dele, era como se o álcool ajudasse a diminuir a dor.
Então um dia minha tia-avó viajou com minha mãe, a mãe dela e os dias se passaram e houve uma festa, meu tio nos levou e ele já estava bem bêbado, eu pensei então em aproveitar para beber uma vez que ele nem notaria, então minha tia ligou, minha mãe estava em cirurgia devido uma úlcera que estourou, quando meu tio nos contou eu estava tão bêbada que comecei a rir.
Foram cinquenta e um dias internada e então ela morreu, em setenta e dois dias perdi meus pais, perdi minha razão de viver.
Minha tia assumiu a guarda de minha irmã e a minha, mas com o tempo minha irmã arrumou um namorado e para eu parar de pegar no pé ela arrumou um rapaz pra ficar comigo e eu idiotamente me enamorei por ele.
E foi ai que tudo deu errado.
Esse cara me deu um celular para que pudéssemos conversar quando quisesse, mas meus tios descobriram e então eu tomei uma surra, nunca entendi o porque de eu apanhar por ganhar um celular, eu seguindo conselhos de uma amiga denunciei meus tios e parei num abrigo de menores, depois de um tempo eu sai de lá.
Minha tia então colocou a mim e minha irmã pra morar com nossa prima e o namorado traficante dela na casa que eu cresci e ai as coisas que já estavam ruins foram de mal a pior.
Os dois só brigavam e muitas vezes eu era obrigada a sair de madrugada atrás do cara porque minha prima não me dava sossego enquanto eu não fosse. Muitas vezes eu apenas sentava na guarita de alguma casa e esperava algumas horas para voltar pro meu quarto.
Também comecei a usar maconha e continuei com a bebedeira, era meu meio de fuga, até fome eu passei nessa época porque minha prima não cozinhava.
Mas um dia um amigo me estendeu a mão e eu passei a comer na casa dele, quando minha prima dava as festas dela eu fugia pra casa desse amigo para poder dormir, eu até tinha meu próprio quarto lá, eu e meu amigo nos divertíamos, ele me apresentou a igreja evangélica e comecei a frequentar, logo eu batizei e comecei a seguir certinho, ate que me apaixonei por um cara que parecia ser realmente de Deus.
Comecei a sair com ele, mas ele só queria sexo, ele era legal, romântico, me ouvia, mas não queria casamento então terminamos e eu segui na igreja.
Um dia um outro rapaz se aproximou de mim, eu estava triste, o tempo estava nublado, mas ele se aproximou de mim pegou minha mão e começou a falar comigo, a falar sobre Deus, sobre a vida e sobre tudo, eu só conseguia pensar que aquele cara não calava e nem via que eu queria ficar sozinha.
Os dias foram se passando e ele me chamou pra sair, foi o encontro mais estranho de toda a minha vida, ele me buscou em casa e andamos por cerca de vinte minutos sem que pegássemos a mão um do outro, então uma amiga minha que tava na padaria que estávamos passando na frente nos viu e parou o expediente dela pra ir até a gente e pôr a mão dele envolta da minha. Foi estranho, constrangedor e ao mesmo tempo engraçado.
Depois de um tempo passamos a namorar, depois noivar e então casamos. Faz oito anos que estamos juntos, temos uma filha de seis anos que é a luz da minha vida.
Mas a questão é, eu não me sinto ouvida, não sinto que posso ser quem realmente sou e na verdade nem sei quem sou eu. Meu marido não gosta das mesmas coisas que eu, não gosta do meu modo de falar, não respeita minhas origens.
Eu gosto de filmes de ação, de fantasia, romance, amo ler e escrever, gosto de sair para passear na praça, gosto de almoços de domingo tranquilos e sem brigas com toda a família em volta da mesa, pois era o que eu tinha em casa quando meus pais estavam vivos, gosto principalmente do natal, de montar e decorar a árvore de natal em família de decorar a casa e fazer aquela grande ceia natalina e o almoço em família, mas desde que casei não tenho isso.
Parece bobeira para muitos sentir falta de coisas tão fúteis como uma arvore de natal ou um almoço em família que não tenha discussão.
Parece idiota se sentir triste porque seu marido não reconhece seus esforços nem te ajuda lavando ao menos um prato.
Tudo o que eu consegui concluir na minha vida foi com meu dinheiro.
Eu estava feliz fazendo uma faculdade, era meu marido quem pagava, todo mês ele reclamava de pagar, o curso duraria três anos, mas quando deu um ano de curso eu não aguentei mais e larguei, preferi uma vez mais desistir de um sonho para ter um pouco de paz.
Se já pensei em divórcio? Sim pensei, mas quem abrigaria uma mulher e uma criança? Tudo o que sei é que a cada dia me sinto mais e mais vazia, perdi a alegria em ir a igreja, perdi a alegria de apenas sair de casa.
Tudo o que eu quero é simplesmente parar de sentir, porque parando de sentir, não sentiria dor, mas não posso, minha filha depende de mim para lhe dar um pouco de alegria, por menor que seja.
As vezes eu sinto vontade de voltar a beber e me drogar pra poder ludibriar minha mente, me anestesiar e esquecer do mundo, mas não posso fazer isso com minha filha.
Não sei quem sou, não sei quem eu poderia ser, não sei se um dia descobrirei, mas eu adoraria saber.
Talvez o passo a passo da felicidade seja algo inalcançável para mim, ou talvez eu apenas não tenha achado um modo de seguir em frente.

Quem sou eu?
Sou uma esposa, uma mãe, uma mulher, que mesmo sem saber quem é pra si mesma e apesar de todas as pancadas que tomou da vida não desistiu de viver.

NÃO DESISTA DE VIVER.

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Senhorita @laylaagnes

Realmente, uma história triste, infelizmente. Imagino que isso tenha deixado você com muita depressão. Há uma hora em seu texto que mostra isso:

...Tudo o que sei é que a cada dia me sinto mais e mais vazia, perdi a alegria em ir a igreja, perdi a alegria de apenas sair de casa.
Tudo o que eu quero é simplesmente parar de sentir, porque parando de sentir, não sentiria dor...

Mas, que bom que isso aparece em seguida: ...mas não posso, minha filha depende de mim para lhe dar um pouco de alegria, por menor que seja...

Que bom que você possui essa relação com sua filha. Compreendi todas suas tristezas.

Minha vida adulta também virou de cabeça para baixo há alguns anos, por questões que não posso explicar aqui. O que eu consigo entender agora, é que, temos que ser o mais gentis possíveis com todos, pois, a grande maioria de nós está travando lutas internas imensas.

Eu espero que você fique bem e não desista de seus sonhos.

Fiquem bem você e sua filha

boa noite!!

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